Reconstrução de maxila atrófica com osso autógeno de crista ilíaca anterior: relato de caso
Reconstrução de Maxila Atrófica com Osso Autógeno de Crista Ilíaca Anterior: Relato de Caso Atrophic Maxilla Reconstruction with Autogenous Bone Graft from the Anterior Iliac Crest: Case Report Andrea Ashcar Cury C.D.*; Bruno Renato Schmidt C.D.**; Paulo Sergio Rosa Lima C.D.***; Luis Carlos Yshikawa**** MD; Maurício Pegoraro*****MD. Sinopse
Este artigo tem a finalidade de descrever a conduta cirúrgica para a reconstrução de maxila atrófica em paciente que sofreu perda precoce de vários elementos dentais, resultando em uma relação interarcos invertida. O procedimento consistiu no preparo do leito ósseo para a instalação futura de implantes osseointegrados, visando a reabilitação estética e funcional da paciente. Várias áreas doadoras podem ser utilizadas em grandes reconstruções maxilo-mandibulares como: calota craniana, tíbia, costela, fíbula e osso ilíaco (crista anterior e posterior). A área doadora de eleição para este caso foi a crista anterior do osso ilíaco por apresentar facilidade na remoção, pequena morbidade cirúrgica e taxa de infecção pós-operatória inferior a 4 %.1 Grande quantidade de osso pode ser removido, sob a forma de blocos córtico-medulares ou de fragmentos, obtidos através de curetagem da porção medular ou trituração de blocos. A evolução da paciente não apresentou intercorrências.A avaliação radiográfica pós operatória mostrou uma melhora evidente no perfil da paciente, e uma relação maxilo-mandibular mais favorável. Clinicamente, observou-se abertura do ângulo naso-labial, resultando em melhora do perfil. Unitermos
Maxila atrófica – Enxerto autógeno - Sinus lifting – Implantes osseointegrados
osseointegrados, a fim de devolver estética e função ao paciente. A perda precoce de elementos dentais e perdas traumáticas, geram reabsorções severas maxilares que indicam uma cirurgia reconstrutiva primariamente a instalação dos implantes. Tendo como resultante, inúmeros casos em que o capital ósseo do paciente é insuficiente para que sejam colocados cirurgicamente os implantes, e que esses tenham dimensões mínimas para que funcionem como pilares protéticos, capazes de ancorar uma prótese a longo prazo.
O enxerto ósseo é comumente utilizado em cirurgia oral e maxilo facial
para procedimentos como cirurgia ortognática, reconstrução após ressecção de tumores, aumento de rebordos, fissuras alveolares e palatinas.2 Com o advento do fenômeno da osseointegração, apresentado por Brånemark em 1982,3 passou a ser indicação para a criação de condições ósseas suficientes para a instalação de implantes, em maxilas extremamente reabsorvidas.
Esse relato de caso, visa apresentar uma das técnicas utilizadas por esse
grupo com a finalidade de reconstrução maxilar, como preparo para a instalação mediata de implantes osseointegrados. Relato de Caso
Paciente do sexo feminino, 27 anos, caucasiana, teve vários dentes
superiores extraídos aos 12 anos de idade por conduta radical. A queixa principal era estética, por proeminência mandibular e posicionamento retrognata de maxila, o que levava ao aspecto de que ao sorrir, os dentes superiores não eram visíveis.
Avaliação Pré Operatória
O exame clínico revelou características de hipoplasia maxilar ( pseudo
classe III ), ( Fig.1 ), a função se apresentava prejudicada pelo uso de uma prótese parcial fixa, que possuía como pilares quatro remanescentes dentais ( 13, 14, 23, 24 ), um dos quais, 13, indicado para exodontia ( Fig.3 ). Apresentava colapso posterior de mordida com apenas dois terceiros molares, um dos quais com nanismo ( Fig.2 ).
O exame radiológico ( radiografia panorâmica e perfil absoluto ), ( Fig 4
) e o tomográfico ( tomografia computadorizada – Dentascan ) mostrou pneumatização dos seios maxilares ( Fig.5 ). O rebordo residual da paciente tanto na região anterior como na posterior mostrou-se deficiente em todas as suas dimensões, sendo classificado, de acordo com Misch 4 , como classe IV divisão D.
O plano de tratamento, inicialmente, foi direcionado para realização de
osteotomia Le Fort I para avanço de maxila e enxerto ( downfracture ) porém, a análise radiográfica mostrou que tal alternativa seria inviável, uma vez que a paciente não apresentava condições ósseas e dentais ( bloqueio maxilo - mandibular ) suficientes, para a fixação dos segmentos osteotomizados. Optou-se então, pela reconstrução cirúrgica da maxila, para que a paciente passasse a apresentar melhor interrelacionamento maxilo - mandibular, e que tornasse viável uma segunda etapa cirúrgica para a colocação de implantes osseointegrados. Descrição de Técnica
A paciente submeteu-se ao preparo pré-cirúrgico, com a administração
de antibiótico do grupo das cefalosporinas ( Mefoxin 1,0 g E.V. ). Para sedação basal foi administrado um pré anestésico benzodiazepínico, midazolam ( Dormonid 1,0 mg E.V.). Foi realizada anestesia geral, com entubação naso-traqueal, e no momento da indução anestésica, administração endovenosa de corticosteróide, hidrocortizona ( Flebocortid 300 mg E.V. ).
A abordagem cirúrgica intra-oral iniciou-se com incisão discretamente
palatinizada sobre o rebordo anterior, indo da região distal de canino superior esquerdo até distal de canino superior direito, com incisões verticais de alívio bilaterais. O rebatimento do retalho muco periostal, confirmou os estudos radiográficos.
Simultaneamente, o ortopedista elegeu a área em que seria realizada a
incisão sobre a região doadora, levando em consideração aspectos estéticos, uma vez que se tratava de paciente extremamente jovem. Para isso foi marcada a área de incisão, levando em consideração a marca da alça do biquini. A paciente foi colocada em decúbito dorsal horizontal, com coxim no glúteo esquerdo. A incisão na pele de aproximadamente 6 cm, aprofundando plano no subcutâneo com bisturi comum até a visualização do periósteo da crista ilíaca. A hemostasia do subcutâneo foi realizada com bisturi elétrico, bem como a incisão do periósteo. Foi realizado o descolamento do periósteo da tábua externa. Demarcada a área doadora, preservou-se uma tampa da crista ilíaca inserida na musculatura abdominal. Retirado o enxerto em bloco
córtico-esponjoso ( Figs.8 e 9 ) da tábua externa do ilíaco, associado a remoção de fragmentos esponjosos com cureta óssea. Realizada a hemostasia rigorosa da musculatura e do osso com bisturi elétrico, foi colocado um dreno de sucção , abaixamento da tampa da crista ilíaca e reinserção do periósteo e musculatura glútea na mesma, através de pontos simples com fio absorvível polyglactina 910 trançado ( Vycril 1 ). Para o subcutâneo foi utilizado sutura contínua em dois planos ( Vycril 3.0 e Vycril 4.0 incolor ). A sutura intradérmica de pele foi realizada com fio absorvível polyglactina 910 monofilamento ( Monocryl 5.0. ). Realizado fixação do dreno e curativo compressivo. 5,6,7
Uma vez retirado o enxerto ósseo, este foi modelado, levado em posição
e fixado com parafusos de titânio ( Synthes - AO ), ( Figs.10-11 ). Foi realizada a reconstrução anterior, por aposição na vestibular ao mesmo tempo em que foi extraída a raíz do canino direito fraturada. Aproveitou-se o tecido esponjoso curetado e os fragmentos corticais triturados, e esses foram condensados entre os espaços dos blocos córtico-medulares. A reconstrução da pré maxila, levou em consideração ganhar espessura de rebordo no sentido ântero-posterior. Tomando-se o cuidado do descolamento superior bastante extenso para a visualização das fossas nasais, a fim de que não houvesse perfuração das mesmas. Aproveitou-se para a plastia da crista óssea formada pela projeção da espinha nasal anterior, com o propósito de se obter um leito plano para o melhor assentamento do enxerto. A paciente foi levada em oclusão forçada, visto que estava sob efeito de anestesia geral, para que se pudesse observar o novo relacionamento interarcos. Após a reconstrução anterior esse segmento foi suturado com pontos simples isolados, com fio absorvível polyglactina 910 trançada ( Vycril 4-0 ).
Passou-se para o procedimento de sinus lifting do lado direito, que pelo
rompimento severo da membrana, foi abortado, tendo sido apenas protegido com uma membrana colágena ( CollaTape- Calcitek ). O lado esquerdo, após a elevação da parede anterior, foi preenchido com o osso autógeno esponjoso e cortical fragmentado e misturado com 1g de hidroxiapatita absorvível ( BioBase – Biovision ) e 1,0 g de osso humano desmineralizado ( Pacific Coast Tissue Bank ). Essa mistura foi hidratada com sangue colhido da região ilíaca, e levado em posição com o auxílio de carregador de enxerto. Condensado, sem exagero de pressão, e protegido com uma membrana de colágeno ( CollaTape- Calcitek ).
Observou-se no pós-operatório imediato a mudança evidente do perfil (
Fig.12 ), bem como do relacionamento interarcos, mesmo considerando-se o edema inicial.
Controle Cirúrgico
A paciente permaneceu com curativo oclusivo na região doadora e um
dreno por um período de 48 horas. A região de lábio superior recebeu curativo compressivo com Micropore, para contenção de edema. A internação hospitalar foi de 48 horas, a medicação no pós-operatório imediato foi a manutenção do antibiótico, repetição do corticosteróide com uma meia dose, e medicação analgésica ( Tramal 1 comprimido V.O.de 12 em 12 horas, associado a Dolantina –100 mg E.V. ). Após a alta hospitalar, foi mantido o antibiótico, cefalosporina ( Keflex 500 mg – 8 em 8 horas ), mantido por 10 dias. A medicação analgésica foi mantida sob a orientação de só fazer uso em quadro de dor. Foram efetuadas duas tomadas radiográficas imediatas, uma panorâmica e outra lateral absoluta ( Fig. 13 ). No pós operatório o quadro geral de pressão arterial, temperatura, pulso, foram controladas. Apenas a diurese, prejudicada pelo estado de sedação que a paciente foi mantida nas primeiras horas, foi regularizada pela instalação de uma sonda de alívio. O quadro de dor foi suportado pelos analgésicos. A paciente 24 horas depois já se locomovia com auxílio. A higiene oral foi orientada para ser efetuada 3 vezes ao dia, complementada com uso tópico de clorexidina. As compressas de gelo mantidas na área doadora e receptora, durante todo o período de hospitalização. A paciente foi mantida sem a prótese por um período de 10 dias. Apartir do qual essa foi substituída por uma réplica em resina. A dieta foi mantida líquido-pastosa por um período de 10 dias. Discussãoe Conclusão
O enxerto autógeno é o material de escolha para reconstruções nas
grandes perdas ósseas maxilo-mandibulares, devido a sua rápida revascularização e cicatrização, formando osso com qualidade superior àquele obtido através de enxertos alógenos. Os enxertos autógenos não desencadeiam resposta imune e não constituem vetores de doenças contagiosas, como hepatite e aids. Existem alguns fatores a serem avaliados em relação aos transtornos causados pela remoção do enxerto autógeno. Porém, as complicações como dor, infecção, hemorragia, alterações sensitivas e limitações funcionais, podem ser controladas, se for empregada a técnica correta, seguida de planejamento adequado. Nas grandes reconstruções , deve-se planejar a remoção bilateral e consecutiva das cristas illíacas, com espaçamento entre as intervenções cirúrgicas, para restabelecimento do paciente.
É consensual a qualidade superior do osso formado quando
comparamos enxerto autógeno versus alógeno. O fato de se usar ou não esta técnica, está relacionado diretamente ao medo e ansiedade do paciente frente à anestesia geral, à internação por um período que pode ser superior a 24 horas, assim como um custo elevado do procedimento, relacionado principalmente ao ônus da estrutura hospitalar. Os enxertos alógenos são substitutos adequados para casos em que o paciente é portador de alguma patologia que contra-indique a anestesia geral ou procedimentos demorados. Recursos como o descrito, devem ser bem expostos aos pacientes durante a consulta de exposição do plano de tratamento, pois a finalização do tratamento é mais demorada, e pode requerer um número maior de intervenções cirúrgicas, no entanto, os resultados finais, são mais efetivos, e atendem aos anseios e expectativas do paciente. Além disso, este procedimento, melhora o prognóstico do ponto de vista biomecânico, além de permitir uma maior diversidade na seleção da prótese. Abstract
This article is a case report of a atrophic maxilla reconstructive surgery,
using autogenous bone graft from the anterior iliac crest. The purpose of this article is a suggested treatment protocol for rehabilitation of the resorbed maxilla, in a very young patient, who lost most of her upper teeth when she was 12 years old. This kind of surgery was developed to create bone for a second stage surgery to place osseointegrated implants. *
Especialista em Implantodontia Oral pela Universidade Metodista de
Ensino Superior, Ex Residente em Cirurgia e Traumatologia Buco-Maxilo-Facial pela U.C.C.B. e Hospital Escola da Medicina ABC, Mestranda em Cirurgia e Traumatologia Buco-Maxilo-Facial pela U.C.C.B. e Hospital Santa Casa de São Paulo, Coordenadora do Steri-Oss Educational Team de São Paulo. **
Especialista em Cirurgia e Traumatologia Buco-Maxilo-Facial pela
OSEC, Mestre em Anatomia pelo ICB USP, Especialista em Anatomia Cirúrgica da Face pelo ICB USP, Ministrador do Steri-Oss Educational Team de São Paulo, Assistente do Serviço de Cirurgia e Traumatologia Buco-Maxilo-Facial do Hospital Israelita Albert Einstein SP. *** Especialista em Implantodontia Oral pela Universidade Metodista de Ensino Superior, Ministrador do Steri-Oss Educational Team de São Paulo.
**** Médico Anestesista , Chefe do Serviço de Anestesiologia do Hospital Sírio Libanês – SP e Hospital Israelita Albert Einstein SP. ***** Médico Assistente do Grupo de Ortopedia Pediátrica do Serviço de Ortopedia e Traumatologia do Hospital do Servidor Público Estadual de São Paulo – IAMSPE-FMO. Referências: 1. Kaban L.B., Pogrel M.A., Perrott D.H.: Complications In Oral &
Maxillofacial Surgery. 1ª Edição, p. 105-10, 1997. Editora Saunders.
2. Williamson,R.A.: Rehabilitation of the Resorbed maxilla and Mandible
Using autogenous Bone Grafts and Osseointegrated Implants. Int.J.Oral & Maxillofac Imp. v. 4, 476-88, 1996.
3. Breine U., Brånemark P.I. Reconstruction of alveolar jaw bone: Na
experimental and clinical study of immediate and preformed autologous bone grafts In combination with osseointegrated implants. Scand. J. Plast. Reconstr. Surg., v. 14, p. 23-48, 1980.
4. Misch C.E.: Implantología Contemporánea. 1ª Edição, p. 201-21, 1995.
5. Abbott, L.C. : The use of iliac bone in the treatment of ununited fractures.
6. Robertson, I.M.and Barron J.N.: A Method of Treatment of Chronic
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7. Wolf, S.A. and Kawamoto, H.K.: Taking the Iliac Bone Graft: a new
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